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CONTADOR DE HISTÓRIAS E HISTORIETAS E PETAS E TRETAS DE ENTRETER INSÓNIAS A GRANEL OU POR ATACADO

sexta-feira, 31 de outubro de 2008

ENSAIO DESVIRGULADO DE ANTECIPAÇÃO AO QUE JÁ SE VÊ E OUVE À DISTÂNCIA

O rapaz que ainda tinha as mãos peganhentas por ter andado desde o crepúsculo de um dia até ao alvorecer do dia seguinte a colar cartazes partidários relativos à campanha eleitoral em curso encontrou-se com outro que também teria as mãos peganhentas mas não por ter andado desde o crepúsculo de um dia até ao alvorecer do dia seguinte a colar cartazes partidários relativos à campanha eleitoral em curso. E por se conhecerem começaram à conversa acerca daquilo com que cada qual se ocupara durante uma noite inteira e eis senão quando puseram-se à palmada um ao outro no meio da rua. Veio a polícia e interrompeu a cena de pancadaria com pancadaria a distribuir por ambos e levou-os de automóvel e sirene a atroar ouvidos para o chilindró.
No miolo justificativo da narração acontece que o segundo rapaz teria confessado ao primeiro que ainda tinha as mãos peganhentas porque andara desde o crepúsculo de um dia até ao alvorecer do dia seguinte a destruir quantos cartazes partidários relativos à campanha eleitoral em curso viesse encontrando colados nas paredes e entre eles apenas todos os cartazes partidários relativos à campanha eleitoral em curso que o primeiro dos rapazes tinha vindo a colar desde o crepúsculo de um dia até ao alvorecer do dia seguinte.
Toda a gente sabe que se trata de crime punível por lei e logo previsto nos códigos próprios o acto voluntário de arrancar e destruir cartazes partidários oficialmente autorizados pelas instâncias encarregadas de supervisionar e zelar pelo eficaz e igualitário funcionamento de todas e quaisquer entidades públicas e privadas de que dependa o processo eleitoral cuja campanha decorra. Toda a gente próxima ou distante do caso ficou aturdida pelo facto de o juiz mandar libertar de imediato o segundo dos dois jovens e continuar sob prisão preventiva aquele que a falta nenhuma se atrevera e só andara desde o crepúsculo de um dia até ao alvorecer do dia seguinte a colar cartazes partidários relativos à campanha eleitoral em curso.
Alguém depressa veio a descobrir que o rapaz destruidor dos cartazes partidários relativos à campanha eleitoral em curso era enteado do taxista que todos os dias de manhã transportava de borla o escrivão e o juiz desde a casa onde viviam juntos sem conhecimento de ninguém até à sala de audiências onde cada qual na sua função funcionaria e se consumara em separado a audição dos dois delinquentes detidos pela presteza da polícia então chamada ao local do crime por via telefónica pela vizinhança despertada por sua vez pela fogosidade da arruaça em mordidelas e guinchos. Já o outro era filho de mãe solteira e vivia por conta da eventualidade de mínimos expedientes como aquele daquele descoroçoador contrato que o fez andar desde o crepúsculo de um dia até ao alvorecer do dia seguinte a colar cartazes partidários relativos à campanha eleitoral em curso.
O jornalista desentupidor do mistério da coexistência talvez conjugal do juiz e de seu escrivão veio a ser vítima no único caso conhecido em que um motorista de táxi tenha atacado e liquidado o cliente em zona fora de portas e não ao contrário como sempre se deu à estampa e foi justo motivo de contestação por parte da classe. Mas tudo ocorreu na sombra e sem testemunhas capazes de fazer prova e de levar o taxista a pagar pelo desaforo de silenciar de vez a única voz erguida contra as arbitrariedades e a impunidade dessa espécie de clero a trajar becas e togas e o exagero empoado de cabeleiras postiças em tempo ido. E até os polícias que logo responderam à chamada e repartiram mimos por um e por outro dos dois contendores de maneira igual e não somente naquele que de pronto cheirava a culpado seriam inquiridos de modo sumário e convidados a antecipar a hora da aposentação.
O rapaz que ainda tinha as mãos peganhentas por ter andado desde o crepúsculo de um dia até ao alvorecer do dia seguinte a colar cartazes partidários relativos à campanha eleitoral em curso viu-se condenado como arruaceiro a cumprir cento e oitenta dias de prisão efectiva e ao pagamento de indemnização ao outro ofendido determinada segundo a multiplicação das custas hospitalares por idêntico número de dias e sem direito a recurso.
O pior de tudo foi o partido dos cartazes colados por ele e em que ele já lá dentro acabou por votar não ter ganho as eleições.