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CONTADOR DE HISTÓRIAS E HISTORIETAS E PETAS E TRETAS DE ENTRETER INSÓNIAS A GRANEL OU POR ATACADO

quarta-feira, 6 de junho de 2007

COM O SOL BEM PERTO DO ZÉNITE SAIA UMA HISTÓRIA DE AMOR

A ideia é escrever uma bonita história de amor. Uma história onde só o amor seja enredo e circunstância. Seja respiração e voz audível. E seja fluído sem a acidez da paixão. Sem o sarro rancoroso do ciúme. Sem truculências e aleivosias abraçadas como irmãs. Sem arremedos de protagonismo personalizado por nenhuma das duas, no mínimo, faces ocultas. Sem sinais encomendados à lisonja promotora da pequenez verborreica, vulgo lamechices favoráveis a quanto seja piroso, começando pelo rótulo (ou denúncia) do principal ingrediente em toda e qualquer história de amor.
Uma história onde se conte quão grato será, por exemplo, ver uns olhos amarrados a outros olhos, desde a alva à noitinha e noite arriba, sem maior ganho que o de afirmar quem se seja a quem já cumprirá reconhecê-lo, como é de lei, ou não fosse o amor a única força viva em que um olhar vale sempre mais que quantas tonteiras pueris se sussurrem ao ouvido.
Uma história em que a premência de viver a tempo inteiro o tempo todo tão-só se equipare a si mesma. E em que tudo se arrogue de tão transparente como o cristal puro mergulhado em água pura. E em que quanto mais haja de nítido e simples não deixe de estar presente, em absoluto, num assobio, numa melodia instintiva que à pauta não fará questão de chegar, ou num chamamento votado ao clamor silente de quem escutar apenas lhe apeteça.
História de enlevo que suscite enlevo. De paz que desprenda paz, sob compromisso de nunca pintar o céu de negro, senão de noite, com ou sem nuvens de estrelas. E que ate e desate e reate os nós dos confins cerebrais, a resolução atempada do labirinto, nunca esquecendo o cordel a servir de guia, desde a rua às entranhas e regresso.

A ideia era escrever uma bela história de amor. Uma história onde só o amor – como alguém teria dito – se aceitasse como substância e envolvimento. Ou como ar e opinião. E nenhum desses temperos ruinosos lhe corroesse o sentido da opção a ministrar aos passos, de dia ou de noite.
Uma história em que se apreendesse, por exemplo, a sublime eloquência de ver uns olhos amarrados à pastosa sonolência de outros olhos, depois de ouvir nalgum sonho alguns latidos e, varrido o sono para o cais da manhã seguinte, confirmar a medo a liquidez das horas sobre a maré-cheia da madrugada, e ver uma cauda frenética, talvez de aflição fisiológica já em fase última, ali mesmo ao lado da cama, a dar a dar.
“Estou fodido”.