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CONTADOR DE HISTÓRIAS E HISTORIETAS E PETAS E TRETAS DE ENTRETER INSÓNIAS A GRANEL OU POR ATACADO

domingo, 4 de junho de 2006

HISTORINHA DE FADAS PARA ADORMECER CACHOPOS D'OUTREM

Era uma vez um príncipe que ainda não tinha a sua princesa. E a única princesa disponível morava a tão grande distância, que só a cavalo lá se chegaria e ao fim de duas semanas e meia. Mas em todo o reino não havia cavalos. Ou melhor, só havia um. E esse único cavalo pertencia a um pastor, um mocetão rijo e moreno, que vivia com seu rebanho e seu cavalo muito perto da fronteira.
“Dou-te dez moedas pelo teu cavalo”–, mandou o príncipe propor ao pastor através dos seus emissários, de propósito seleccionados para tão nobre como justificável missão.
“Nem por cem”–, respondeu o único cavaleiro possível nas cercanias aos funcionários reais, que assim voltaram de nariz no chão, passo a passo, até ao príncipe.
“Dou-te duzentas moedas pelo teu cavalo”–, mandou sua alteza dizer, desta vez, por outros emissários, escolhidos como sendo detentores de maior capacidade de diálogo e persuasão.
“Nem por quinhentas”–, repontou sem medo o dono do único cavalo em muitas dezenas ou centenas de léguas em volta, grande parte das quais foram nessa ocasião calcorreadas, num e noutro sentido, pelos frustrados servidores de sua alteza.
“Dou-te mil moedas pelo teu cavalo”–, ofereceu-lhe o príncipe, desta feita, servindo-se da voz do velho aio que o criara, desde os cueiros esborraçados até à dramática hora de o ouvir falar em casamento. Se aquele velho vassalo não o convencesse – pensara com grande acerto o jovem príncipe –, ninguém mais o convenceria.
“Para que quer ele o cavalo?–, perguntou enfim o pastor-cavaleiro, cônscio de quão importante seria, nesse momento, a decisão que ele, um vulgar servo da gleba, poderia e deveria tomar, a favor ou contra o reino onde nascera e onde gostaria de morrer.
“Para que possa ir em demanda da princesa, ao reino vizinho, e com ela se casar”–, confidenciou o velho aio, com lágrimas nos olhos e de joelhos em terra, quase morto de canseira e desesperança.
“Podes levar o cavalo. Não te quero nada por ele”–, diz-lhe o pastor, ajudando o ancião a levantar-se e encaminhando-o até à estrebaria, onde o alazão, nervoso, relinchava e pinoteava com graciosidade.
Quando o príncipe, um mês depois, vinha a atravessar a fronteira, de regresso, trazendo consigo a princesa, que viria a ser sua esposa, já por cá tinha sido implantada a república. Viu-se, por isso, obrigado a voltar para o país do sogro, mas a pé: o cavalo foi-lhe confiscado na alfândega por ele não provar que lhe pertencia.
Conta a lenda, ainda, que a princesa também não quis mais nada com ele, preferindo então instalar-se na nova república como professora de equitação. É que em todo o país só havia um cavalo, que era dela e do marido, o pastor.