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CONTADOR DE HISTÓRIAS E HISTORIETAS E PETAS E TRETAS DE ENTRETER INSÓNIAS A GRANEL OU POR ATACADO

sexta-feira, 4 de agosto de 2006

QUÃO BELA E FECUNDA É ELA, A NATUREZA

Ao longe, muito longe, os píncaros da serra maior. E antes deles, com certa impertinência de pueris reflexos, os montes de menor monta, os pinheirais ainda aquém do algoz com um tamanho de fósforo, os tons em progressivo esbatimento consoante a distância ou a vegetação que num ou noutro ponto subsista. E água com abundância, como é de lei nestas terras baixas, onde se desfaz, se aglomera e transforma em solo arável, haverá muitos milénios, tudo o que a erosão vai trazendo por arrastamento de do alto, desde os cômoros menos atrevidos aos socalcos e à massa bruta da penedia das vertentes. E sempre desponta uma fonte, um regato, um ribeiro, um rio a sério, dando azo a ínsuas de terra escura, riquíssima, passível de emprenhar à mínima gota de vida que nela se faça cair.
Nunca antes do fim da tarde, quando não noite franqueada, se pensa que eles alcançarão o sopé da montanha. Só amanhã, com optimismo na previsão, se reunirão as condições ideais para a ultrapassagem do pico, lá muito em cima, à altura das nuvens. Quase no céu.
“E se nós fôssemos de volta”―pergunta ela, arrancando a mochila das costas e atirando-se para a sombra da primeira árvore que lhe surgiu à frente―,“ou nos ficássemos já por aqui?”
Ele, sobre um sorriso enigmático, observa-a de onde está, ainda de pé, ainda no meio do carreiro que os levava, e também arranca a mochila do lombo, deitando-se-lhe ao lado, na erva.
“De facto, com esta caloraça toda, talvez convenha pensar duas vezes, pelo menos”―, diz ele, concordante e amável, sem desligar aquele seu sorriso de tão subtérrea fresquidão, que quase nele se vêem morcegos dependurados no tecto de cabeça para baixo.
Daí a nada, e daí a horas, e daí até à alvorada do dia seguinte, dentro de uma tenda montada à velocidade da luz, e porque o rio passa perto dali, por detrás da profusão de canaviais, a natureza deu azo a ínsuas de terra escura, riquíssima, passível de emprenhar à mínima gota de vida que nela se faça cair.
No próximo ano, sabe-se lá, talvez tentem de novo. Há muitas formas de chegar ao pico e de o ultrapassar. Uma delas já se sabe como é.