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CONTADOR DE HISTÓRIAS E HISTORIETAS E PETAS E TRETAS DE ENTRETER INSÓNIAS A GRANEL OU POR ATACADO

quinta-feira, 21 de dezembro de 2006

DA RAZÃO QUE PÕE A GIRAFA A TANTO GOSTAR DE CERTAS ACÁCIAS

Aproveitando o declive por fora da cerca de rede aperaltada por buxo e roseiras, passeia-se um humílimo regato de fugaz conformação, filho natural das derradeiras chuvadas. Saltita e cantarola em ínfimas cascatas sem viabilidade de espuma, como se tivesse pressa de tornar às origens, às nuvens que o determinaram há não muito tempo. E ao lado do regato sem esperanças de chegar a rio, um carreirito estreito e irregular, atapetado por umas pazadas de gravilha e cacos de tijolo de obras perto, a debruar o matagal de acácias onde às tantas se entranha e se some da vista exterior. Perde então o requisito de dar fé de quantos passos se aproximem do bosque, para se tornar, agora sim, num tapete de folhas e musgo, onde só os gravetos secos se pronunciarão, se pisados.
Lá nas alturas, ou em terra, na sebe, no esforço de riacho, os pássaros cortejam-se e perseguem-se entre negaças, piropos e piruetas, não deixando de estar atentos a quanto aconteça, dentro e fora da mata onde nasceram, cresceram, montaram casa e tencionarão procriar.
Não muito longe, sobre as encostas do monte sobranceiro ao complexo urbanístico em construção desenfreada, impõe-se a presença simpática de um pinhal sobrevivente ao lume dos algarismos empreiteiros, oferecendo-se como fundo e realce do que à boca de cena se lhe antepõe. E algumas dezenas de gruas, talvez mais elegantes que girafas a largar excrementos na savana, dão o toque de finados ao quase nada de paisagem campestre que por se veja, tal é a voragem dos tempos e de quem tem poder de lhes dar corda e balanço. Ou de travá-los, quantas vezes, porque assim convenha.
Afinal, a cerca de rede tem um buraco rente à relva do jardim interior que dá a volta a todo o edifício – escola, instituto ou departamento estatal, tanto faz como fará a esta história em curso intensivo. E por esse buracão se sai e se entra de gatas, a caminho da protecção do matagal de acácias ou em sentido contrário, deixando a sombra por inteiro à passarada.
Ninguém consegue imaginar por que razão o jovem apareceu dependurado, pelo pescoço, num candeeiro do jardim, e não optou por um pinheiro, uma acácia, uma das inúmeras gruas ali tão a jeito. Tinha os joelhos cheios de terra, como se antes tivesse gatinhado através do buraco na cerca em direcção ao fim. As mãos, entretanto, estavam tão limpas como se tivesse acabado de as lavar.
Só os passaritos poderiam contar com rigor o que de facto se passou por ali. Mas nada dizem, entretidos que andam entre piruetas acrobáticas e piropos sussurrados ao ouvido.