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CONTADOR DE HISTÓRIAS E HISTORIETAS E PETAS E TRETAS DE ENTRETER INSÓNIAS A GRANEL OU POR ATACADO

domingo, 3 de dezembro de 2006

MORTE LACUSTRE À DERIVA SOBRE UM FUNDO AGRESTE E A CORES

Atente-se nos limos, à transparência, cobrindo e colorindo o fundo de verde, enquanto protegem dos rochedos quaisquer pés menos habituados a sofrê-los. E observe-se aquele barco, além. Aparenta a maior tranquilidade. Nem um arrepio de ar lhe belisca o reflexo no espelho que à tona de água o detém e mantém. Quem adivinharia que lá dentro dele está um corpo de mulher, muito jovem, muito nu, muito morto? Por ora, só mesmo as aves viajantes o espreitarão do alto, viciosas, antes de zarparem em direcção a mais encalorados paradeiros, que o tempo é disso, até ao ano que vem, se vier. Para a timoneira daquele bote imobilizado, se tão inerte e alheia à vida como à morte em torno dela, já não virá.
A âncora, de quatro dentes, está cravada na sombra do barco que o sol desenha no lodo do fundo. E a corda, estando curta, está tensa, como se alguém, talvez o barqueiro, nessa medida a tivesse dimensionado de propósito, tendo como norma que lagoas deste género não sofrem a inconstância das marés e o desconforto, por vezes, do sal a mais.
Com sorte, ninguém, por enquanto, conseguirá aperceber-se de tão misteriosa ocorrência. E ninguém se cuidará muito em descobrir e avançar uma explicação credível e a contento dos próprios brios postos à prova.
E as aves viajantes, em princípio, não cometerão o despudor da gabarolice do que puderam ver lá de cima, já em direcção a mais encaloradas paragens.