À ANCESTRALIDADE DE UMA PAIXÃO A SOPESAR COM ZAGALOTES
Uma paixão antiga, muito antiga. Quase tão antiga como ele, se já lançado pelos quarenta de celibato a empedernir-se em rugas prematuras mas profundas. Fora ela a primeira fêmea em que um dia − um dia de sol diferente, como se depreende pela luminosidade da cena mantida na memória − pousara os olhos e a ideia com arreganho agrimensor. Não era mais que um fedelho ainda aquém da medida, no entanto, e ela, já em tamanho natural, uma mulher. E que mulher.
Ainda com aquela primeira imagem gravada a cuspo de olear prepúcios – ela, de vestido arregaçado meio palmo acima dos joelhos, a demolhar as pernas numa fonte pública –, recolheu ele a malevolência da solidão sem descargas justas em tempo justo, sempre imune à terapêutica ministrada por conselhos amigos e amantes de quem, tal como ele, tanto se amaria a si próprio, afinal. E a velha masturbação, esse estremecido gozo à sombra de cânones nunca escritos mas desde há milénios a ler e reler à mão por cada qual em si mesmo, seria um desvio, uma desculpa patética, um engano supressor dos desenganos maiores nunca a tempo declarados, um vício juvenil posto ao dispor do imaginário através de toda a vida.
Toda a vida, a partir do momento em que a descobriu, ele lhe acompanhou os passos à distância, temendo-lhe a reacção ao verificar-se objecto daquela perseguição contínua, irracional, talvez doentia. E de longe, quedo e manso, a viu casar-se com outro mais afortunado. E viu-a ter filhos e criá-los, vesti-los e calçá-los, até que se formaram, se casaram e se aventuraram horizonte além. Viu-a ficar de novo a sós com o marido, mais felizes por se sentirem cientes do dever cumprido e ainda ser possível a reinvenção do amor. E pôde vê-la, enfim, enviuvar, aquando dos destrambelhos da caça, num suspeito incidente entre espingardas e mato, que lhe roubou, a ela, sua amada, o ainda viçoso companheiro de e para tantas e tão promissoras jornadas de paixão sem rédeas.
Só não a veria casar-se outra vez e outra vez fingir o amor de trepar paredes até ao telhado, ainda que com as têmporas já um tanto embranquecidas, porque veio a ser condenado por homicídio qualificado à pena máxima e morreu na prisão.
Ainda com aquela primeira imagem gravada a cuspo de olear prepúcios – ela, de vestido arregaçado meio palmo acima dos joelhos, a demolhar as pernas numa fonte pública –, recolheu ele a malevolência da solidão sem descargas justas em tempo justo, sempre imune à terapêutica ministrada por conselhos amigos e amantes de quem, tal como ele, tanto se amaria a si próprio, afinal. E a velha masturbação, esse estremecido gozo à sombra de cânones nunca escritos mas desde há milénios a ler e reler à mão por cada qual em si mesmo, seria um desvio, uma desculpa patética, um engano supressor dos desenganos maiores nunca a tempo declarados, um vício juvenil posto ao dispor do imaginário através de toda a vida.
Toda a vida, a partir do momento em que a descobriu, ele lhe acompanhou os passos à distância, temendo-lhe a reacção ao verificar-se objecto daquela perseguição contínua, irracional, talvez doentia. E de longe, quedo e manso, a viu casar-se com outro mais afortunado. E viu-a ter filhos e criá-los, vesti-los e calçá-los, até que se formaram, se casaram e se aventuraram horizonte além. Viu-a ficar de novo a sós com o marido, mais felizes por se sentirem cientes do dever cumprido e ainda ser possível a reinvenção do amor. E pôde vê-la, enfim, enviuvar, aquando dos destrambelhos da caça, num suspeito incidente entre espingardas e mato, que lhe roubou, a ela, sua amada, o ainda viçoso companheiro de e para tantas e tão promissoras jornadas de paixão sem rédeas.
Só não a veria casar-se outra vez e outra vez fingir o amor de trepar paredes até ao telhado, ainda que com as têmporas já um tanto embranquecidas, porque veio a ser condenado por homicídio qualificado à pena máxima e morreu na prisão.
<< Home