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CONTADOR DE HISTÓRIAS E HISTORIETAS E PETAS E TRETAS DE ENTRETER INSÓNIAS A GRANEL OU POR ATACADO

segunda-feira, 5 de fevereiro de 2007

PERAMBULAÇÕES ONDE O IMAGINÁRIO É MATÉRIA-PRIMA E DESCULPA

A fronteira é mesmo aqui. Foi considerado este riacho como limite natural. O carreiro de pé posto, impresso na folhagem desta banda e da outra por nem se sabe quantas gerações de contrabandistas, leva quem venha a passar sobre uma fileira de pedregulhos que brotam da água de dois em dois palmos, fingindo-se ponte e não sendo deveras ponte nenhuma. Com eles se evita, porém, o desconsolo de encharcar os sapatos ou de ter que descalçá-los antes do salto, para lá ou para cá.
Muito poucas vezes se vêem, mas vêem, de noite e de dia, nas redondezas de ambos os lados, guardas fronteiriços armados até à alma de cães, que quando a festa é rija costumam trazer como suplentes. Reconhece-se e disso se faz cartaz que em já distantes eras se faziam por este ponto enormes transacções, quer de droga, quer de material roubado, quer ainda de gado e de gente contratada a peso para as jornas mais detestáveis, lá no sul, onde nem o sol é gratuito.
Há que estar com atenção ao canto dos pássaros. Eles têm o bom tom de dar sinal, emudecendo, quando sentem guardas emboscados ou em aproximação, de onde se infere que nem eles gostarão da canzoada, fardada ou genuína, como é fácil de perceber e acatar. Mas ainda haverá quem goste de se ver encurralado, esmurrado, esmordaçado e engradado, e isto se se tiver a fortuna de não levar um tiro nas costas, se bem que dado para o ar, durante a perseguição?
O carro, por não haver estrada, já não pode seguir além deste sítio. E ir a pé, sendo incómodo, dá menos nas vistas. Bastará um razoável par de binóculos, agachado num qualquer refojo destes cerros penhascosos, ou a mira telescópica de uma boa carabina, para controlar todas as movimentações tidas como dúbias num ermo assim, tão distanciado já das últimas casas de gente. Bem melhor será esperar, com paciência, e dar um salto até lá de madrugada, apesar do frio…
“Tu não tens frio? Guarda o mapa e vem-te deitar”.