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CONTADOR DE HISTÓRIAS E HISTORIETAS E PETAS E TRETAS DE ENTRETER INSÓNIAS A GRANEL OU POR ATACADO

terça-feira, 6 de março de 2007

AO TEMPO E À MANEIRA DE O UTILIZAR COMO RÉGUA E ESQUADRO

A casa, outrora nova, a estrear, de paredes remetidas àquela podridão salitrosa que só o camartelo curará. Foram muitos anos de humidade a impregnar-se até à alma sem o antídoto do sol. Há musgo semeado nos recantos mais sombrios. E há osgas inoportunas, lesmas vagarosas com precisão de sapato que as resuma a ranho e asco, lagartas viscosas, centopeias e mosquedo, ira de vespas. Todo esse gado costumeiro em que a decrepitude e o abandono se complementem, tal e qual as duas faces de uma moeda de valor irreconhecível nas tabelas oficiais. E ratos haveria, haveria, se lá não se multiplicassem também tantos e tão famintos e arredios gatarrões. Como se sobre eles, à nascença, não pairasse o espectro da fome, ou a dita multiplicação fosse a solução do problema.
O bolor é rei usurpador de um trono onde antes se sentariam tapeçarias e cortinados, telas esquecidas de quem as assinou, livros com dedicatória manuscrita haverá séculos, flores cujo encanto as destingiu, mobiliário num estilo já fora de uso até se usar outra vez, candelabros mais pesadões que luminosos, tectos de estuque artístico a poente do fendilhamento final a rematar no soalho, murais norteados pelos cordões de bolsas mecénicas, vulgo perenidade sem retorno em nomeada e em sustento estomacal equivalentes.
Com a decadência da casa, pertinente como lepra a caminhar sobre si própria, decairá quem nela se tenha à espera sem ter de quê, quem nela habite e a pretenda sua e como tal a viva e respire e ame e sofra, depois de pagar a tença, no prazo certo, ao fóssil proprietário.
Está velha a casa, pois está. Mas bem mais velho há-de estar quem lá viva, quando quase tão velho como quem lá em casa já não more por ter morrido.